A intolerância
religiosa contemporânea nos leva a reflexões de muita complexidade. Não se ter
apenas uma visão pragmática, porque nos levará a permanência das causas e nada
modificará, pois estaremos fortalecendo os interesses de uma cultura de guerra
imposta a milhões de anos. Esta cultura de guerra permite a manutenção da
disputa, da competição, do poder; das
crenças religiosas, imbuindo aos crentes à ideologia da fé cega, fanatismo,
racismo, desamor, desrespeito, descrença e do medo.
Nasci na classe social menos
favorecida de Florianópolis e Umbandista. Meu primeiro batismo foi no Centro Espírita
de Umbanda Caboclo Turi, com um mês de vida. Fui criada na Umbanda com sua
filosofia, praticas e artes. Tudo era belíssimo até o momento que fui estudar
na escola de ensino fundamental. Minha mãe, professora dedicada, já me
inserindo ao bom estudo, buscou inserir-me num colégio de “freira” com bolsa de
estudo integral. Neste dia começou o drama na minha vida. A aula de religião,
desde o pré-escolar, me conduzia a crer que a querida Umbanda era coisa do mal.
Na metade daquele ano me fiz ser expulsa para desespero da minha mãe. Não tinha
clareza o que me fazia ser tão peralta com 6 anos de idade já enfrentava a dislexia que me
acompanha até os dias de hoje, e que dificultava muito minha vida escolar, além
da falta de indulgencia das “irmãs de
caridade”. Foi muito difícil e eu fui para
uma escola estadual. Mesmo mudando de escola quis entender que Deus era aquele
que estava sendo ensinado nas escolas. Busquei fervorosamente fazer a primeira
comunhão aos 7 anos, porque precisava entender este Deus. Segui os preceitos
cristãos católicos e não compreendia Deus, porque na igreja pregavam muita
coisa diferente da minha querida Umbanda que aprendi a amar com todo o meu Ser.
Mesmo vivenciando e sendo católica eu era constantemente chamada de macumbeira
ou filha de macumbeira. Nunca fui convidada a participar de aniversário de “amigas”
porque eu era macumbeira, era filha de macumbeira.Desisti de ser católica. Fui viver
a vida de forma descrente. Ser umbandista era ir para o inferno e ser católico
também, afinal Deus punitivo não era coisa boa. A adolescência foi difícil sem
uma crença. Não queria viver estigmatizada, quis esta inclusa numa sociedade e
o que aprendi é que a sociedade esta doente. Fui ser evangélica da Deus é amor.
Que amor que nada. Logicamente, todas as religiões são boas pelo potencial do
religare não pelos seus condutores. Verdade que Deus é amor, mas nos templos,
entre os poderes dos dirigentes só vivenciei a cobiça, do poder do controle dos
superiores aos menos favorecidos de conhecimento. Só que eu busco conhecimento
permanentemente. Sou geminiana. O estigma que eu carregava novamente foi
cutucado dentro da igreja e fui embora. Estigma por estigma, fui viver a minha
verdade. Sou Umbandista graças a Deus. O estigma foi vivido por mim e por
várias outras pessoas é até hoje um vírus que espalha uma doença terrível junto
à única raça que conheço. A raça Humana. Já fui repudiada por ser “branca” inclusive dentro
do movimento negro; já fui repudiada por ser Umbandista pelos candomblistas e
pelos espíritas. O estigma é um mal criado pela cultura de guerra para
aniquilar sua, minha, nossa identidade.
Vimos falar
sobre a intolerância religiosa, porem para adentrarmos neste tema é necessário observar
várias facetas e intenções por trás de cada movimento e manifestação individual
e coletivo, para compreender e então extingui-la. Sim, precisamos compreender
as facetas da intolerância para poder criar estratégias para a extinção desse
mal que nos aflige.
Primeiro
precisamos entender a intolerância religiosa. Intolerância é a falta de
tolerar. TOLERAR, conforme o dicionário significa:
1. Sofrer o
que não deveríamos permitir ou o que não nos atrevemos a impedir.
2. Consentir;
permitir: suportar; aguentar; admitir, Aceitar com indulgência – ACEITAR (grifo
nosso).
A tolerância é
a “boa disposição dos que ouvem com
paciência opiniões opostas às suas”. A tolerância precisa ser transmutada e
passar pela aceitação que significa receber com gratidão. Aceitar a Verdade Divina
sobre todas as coisas é uma questão Sine
qua non. Quando aceitamos a Verdade, aceitamos as diferenças, aceitamos o
amor, aceitamos o outro, e encontramos a paz em nós mesmos. Sim aceitar as
diferenças é nos permitir viver em paz.
ACEITAR[1]
o outro é se colocar na posição do outro. O Outro que falamos é o nosso irmão.
Sim irmão. Somos todos irmãos. Se colocar na posição do outro e compreender
como um ser humano com eu escolhe vivenciar uma religião diferente de mim, ter uma
visão diferente, outro lado da Verdade. A
Verdade tem vários lados, muitas visões e nós temos muita dificuldade de
aceitar o lado oposto da nossa visão. Porque vivenciamos a cultura da guerra e
esta cultura nos faz querer ter a razão e quem tem razão deixa de ser feliz na
maioria das vezes.
Só aceitamos quando conhecemos,
então devemos conhecer o diferente. O conhecimento possui quatro pilares: a
arte, a filosofia, a tradição sapiencial e a ciência. Então precisamos entender
cada tradição, todas as filosofias de vida, todas as artes e todas as ciências.
A busca pela Verdade.
Quando aceitamos
a realidade estamos dando o primeiro em direção à transformação. Devemos transformar,
incessantemente, este paradigma para o da cultura de paz. Passar do verbo intolerar
para o ACEITAR. A aceitação da fé do outro passa pela
caridade, pela bondade, pela generosidade, pelo respeito a Deus, PELA
COMPAIXÃO, pelo SAGRADO[2].
A intolerância
religiosa é o Bullying. Sim bullying. Bullying não é só escolar; é militar, é
social, é religioso, foi criado pela cultura de guerra. Bullying é uma
expressão em inglês que significa toda a violência não física, todo o tipo de
agressão e condutas verbais, desde os simples insultos, a fazer piadas e
gozações, o uso de apelidos cruéis a ridicularização. Bullying é uma forma de
pressão social que acarreta, por vezes, traumas muito importantes na vida dos seres
humanos que são sujeitos diariamente a este tipo de maus-tratos. Bullying é assédio, é intimidação, é implicar,
é agressão social.
A intolerância
religiosa é racismo. O racismo é a tendência do pensamento, ou o modo de
pensar, em que se dá grande importância à noção da existência de raças humanas
distintas e superiores umas às outras, normalmente relacionando características
físicas hereditárias a determinados traços de caráter e inteligência ou
manifestações culturais. Ao longo da história, a crença na existência de raças
superiores e inferiores -- racismo -- foi utilizada para justificar a
escravidão ou o domínio de determinados povos por outros. É cultura de guerra,
um povo de poder sobre o outro em todos os níveis inclusive de impor a crença
religiosa. Vemos isso diariamente na TV.
O Dia da Consciência Negra foi criado para retratar,
sistemática e permanentemente a disputa pela memória histórica de um povo que
teve seus direito abolidos pelo poder de outro povo que acredita na cultura de
guerra. Preservar a memória de um povo é
uma das formas de construir a história.
Faz parte da história de um povo a arte, as
tradições, a filosofia e a ciência desse povo. Dentro do pilar das tradições do
povo africano, atualmente no Brasil, podemos falar dos rituais de matriz
africanas ou os afro-brasileiros como a umbanda e o candomblé que faz parte
desse movimento. Entretanto, vemos que há muita gente que faz parte do
movimento negro que repudia a religiosidade das divindades africanas, dos
orixás e essas pessoas do movimento negro praticam o racismo, o bullying
religioso por não aceitar a origem de mais de 5.000 anos de existência da
religião de matriz africana. Observamos
o que esta acontecendo no mundo.
Teerã passou pelo
grande encontro, pelo dia do sacrifício. O
Eid al-Adha ou "Festa do Sacrifício" muçulmana marca o fim da
peregrinação anual à Meca. Segundo a tradição islâmica, é uma celebração em
memória da disponibilidade de Abraão de sacrificar seu filho Ismael para Alá -
na hora do sacrifício o menino foi substituído por um carneiro[3].
Precisamos desenvolver o paradigma de PAZ[4].
Paz é dança. A paz é o caminho como nos
ensina Gandhi. Paz é o abraço afetuoso. Crema nos ensina que devemos lutar pelo
Ser e não pelo ego.
A cultura de
paz nos ensina a compartilhar, a viver no Sagrado, a aceitar a vida humana em
sua plenitude, em sua inteireza, é transformar o mundo num mundo melhor, é ser
a transformação que você quer no mundo (Gandhi), é fazer o mundo um bom lugar
para se viver, é abandonar os dramas, as dores, o pessimismo, as frustrações. Viver
em paz é desapegar, é transformar, é transmutar, é viver consciente, é viver a
entrega, é estar disponível, é estar a serviço da Luz.
Estar a
serviço: o viço do ser. É focar a lei do amor. É estar vazio do ego e dos
apegos.
Oh Mestre! Fazei-me um instrumento de vossa
Paz. São Francisco de Assis
Onde esta o Sagrado.
Dentro de você, em sua volta, no mundo, no cosmo, em Deus? Onde esta? Dentro dos
templos, na natureza, no ser humano, na vida? Onde e quando eu vivencio o
sagrado? Vamos refletir.
Oração Dos Nativos Africanos Pela Paz[5]
Deus Todo Poderoso, Grande Polegar que ata todos os nós, Trovão que
Ruge e parte as grandes árvores; Senhor que tudo vê até as pegadas do antílope
nas rochas, aqui na Terra, Vós sois aquele que não hesita em responder a nosso
chamado. Vós sois a pedra angular da Paz.
Axé de Paz e Luz!
Obs. Convidamos a todos para participar no dia 22
de novembro, do debate sobre o assunto desse artigo
Horário: 10h00min
Local: CELESC
Palestrante:
Babalorixá Oba Oso Pakin Thibes
Tatalorixá Kátia Regina Luz d’Omulú
Profº. Evandro de Oliveira Brito
[1] CREMA.
Roberto, Saúde e Plenitude. Um caminho para o ser. São Paulo: Summus, 1995.
[2] ELIADE,
Mircea. O sagrado e o profano. [tradução Rogério Fernandes]. – São Paulo:
Martins Fontes, 1992.
[3] Fonte:
terra.com.br. http://pt.shvoong.com/humanities/1773371-que-%C3%A9-bullying/#ixzz2AV4NEtPV
[4]
FHB – Formação Holística de Base da Unipaz
[5] Fonte: unipazsc.org.br